sábado, 16 de junho de 2007

ANTE O OLHAR INEVITÁVEL

Inevitavelmente deixo-te os rascunhos da terra perdida, no recato das estantes imprórias, inacessíveis ao sentido e à exaltação fria das vozes sem som, com as palavras amorfas e os pedaços de carinho que são como caminhos que se oferecem à torrencial inquietação dos sentidos impróprios. Tudo o que sinto, tudo o que penso são lugares de ninguém, com a força da sensibilidade insensível! Sabes que é assim, deste modo e não de outro. Os sentidos possuem o sem sentido que perde a referência da acção, aquela que tive para ti, depois de ter ido passear pelas ruas do incógnito. Profícuas, talvez diáfanas, complexas quanto baste, esquecidas por vezes no tempo, nas margens da indiferença, as palavras, diferentes, erguem-se sobre a definição sem definição, com a prosa sem poros, talvez razão porosa do silêncio aberto e impróprio de todas as ideias. Encontro aqui a secreta transparência do olhar inevitável, comprometendo o sorriso sem lábios, apenas ulular e muito vago. És a luz inevitável que perturba o divino e bebe a chuva que se concentra nos telhados, enquanto o sono não chega. Fico adormecido entre as corolas anilinas e os rastos da morte face aos espelhos que naufragam no pranto do silêncio. Escuto-te com o amor derramado, com a metamorfose da gravitação e o prelúdio das estrelas, pétreas e coroando os círculos celestes. Tomo-te no esplendor esparso que explode encarquilhando a noite, face aos sinos do amor. Continuas a cavalar a núvem e o corpo adormece no bairro livre, aquele onde que sempre te brinde. Vou brindar-te novamente, depois do dia esquecido, com o amor prometido… perante os espelhos que continuas a pintar. Fico contigo, ainda que não esteja, sou a surpresa que enxuga.

Porto, 23 de Março de 2007 – 10:16h

Sem comentários: